Projeto de Incidência Política promove fortalecimento nacional e regional
Durante seminário mundial, panelistas apresentaram conquistas do Projeto na América Latina e Caribe
Muitas vitórias se comemoram na América Latina e Caribe ao final de três anos de implementação do PIP – Projeto de Incidência Política (conhecido como Real World Strategy, em inglês). Foi o que compartilharam Giovanna Modé, coordenadora de comunicação e mobilização da CLADE, Esperanza Cerón Villaquirán, coordenadora da Coalizão Colombiana pelo Direito à Educação e Maitê Gauto, assistente técnica da Campanha Nacional pelo Direito à Educação na mesa dedicada a apresentar os resultados mundiais desse projeto que também teve forte impacto na incidência por educação na África e na Ásia (conheça estas experiências mais adiante).
Em 2010, após cinco anos de existência em que apoiou diretamente 51 países e ações regionais na África, Ásia e América Latina, o projeto financiado pelo governo holandês passou por um processo de avaliação e sistematização externa – o que resultou no relatório Projeto de Incidência Política – rumo a uma Educação para todos e todas até 2015.
Foi feito um panorama das conquistas e desafios internacionais, regionais e nacionais, assim como 12 estudos de caso aprofundados três de cada região participante. Destacam-se algumas lições comuns e recomendações para o trabalho de incidência política futuro pelas metas de Educação para Todos (EPT). O relatório está disponível para download em inglês, castelhano, francês e português e na página http://www.campaignforeducation.org/rws.
América Latina e Caribe
O projeto chegou à América Latina e Caribe em 2007, beneficiando diretamente ações de incidência política em 10 países. Além disso, como revelam os três estudos de caso nacionais e o estudo regional (este sobre a incidência pela não discriminação na educação) que entraram no relatório do PIP, o projeto permitiu a difusão de aprendizagem coletiva e o fortalecimento de atores mobilizados na luta pelo direito à educação.
O PIP revelou obstáculos estruturais para a região: a criminalização dos movimentos sociais e de seus/suas ativistas, o risco de cooptação pelo Estado, a censura aos meios de comunicação por um lado e, por outro, a forte resistência da grande mídia às demandas sociais, a recusa dos Estados em reconhecer a sociedade civil como interlocutora legítima e o dissenso como qualidade fundamental na prática política, a dificuldade de mobilizar as bases e a vulnerabilidade dos movimentos e organizações sociais em termos de financiamento e sustentabilidade.
Em tal contexto, o PIP possibilitou o desenvolvimento de uma ampla estratégia de justiciabilidade do direito à educação; da Campanha pela não discriminação na educação; a formação de subgrupos temáticos na rede, como por exemplo o grupo focado na gratuidade da educação; e contribuiu para os esforços para ampliar a participação da sociedade civil em conferencias internacionais e regionais, caso da VI Conferência de Educação de Adultos da UNESCO (2009) e do processo Metas 2021 (2010).
“De modo geral, há um sentimento muito positivo de fortalecimento do movimento pelo direito à educação na América Latina e Caribe no marco do PIP, o projeto contribuiu para a consolidação da CLADE como ator político regional e internacional, fortalecendo assim o chamado à implementação da agenda pelo direito à educação e levando em conta os níveis nacionais, regionais e internacionais, assim como as relações entre eles – o que, por fim, entendemos como um fortalecimento de todo o movimento que atua pelo direito humano à educação na região”, comentou Giovanna.
Brasil – segundo Maitê Gauto, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação utilizou recursos disponíveis através do PIP para pressionar os atores envolvidos na Conferência Nacional de Educação (Conae) a adotar o Custo-Aluno Qualidade Inicial (CAQi), entre outras reivindicações; graças ao trabalho de incidência desenvolvido por essa coalizão nacional na Conae e junto ao Conselho Nacional de Educação do Brasil, o CAQi se transformou em referência para a o financiamento público da educação. Formada por mais de 200 organizações, a Campanha Nacional aposta em seu enorme potencial de articulação da sociedade civil, sua vocação de construir lideranças efetivas desde a base e de produzir transformações reais – o que justamente constitui o pano de fundo para a proposta do PIP.
Colômbia – um vasto trajeto de incidência política da sociedade civil, no qual a Coalizão Colombiana pelo Direito à Educação teve papel protagônico, resultou no reconhecimento da gratuidade da educação primária pelo Tribunal Constitucional do país, com recomendações para a aplicação do princípio de progressividade para o ensino médio e superior. Até a metade de 2010, a Constituição da Colômbia foi ambígua em relação às tarifas cobradas pelas escolas públicas – o que na prática resultou em não-gratuidade e enormes desigualdades de acesso à educação no país. Esperanza Cerón Villaquirán, coordenadora da Coalizão Colombiana, relatou esse caso bem-sucedido de incidência que começou em 2008, com a Campanha pela Gratuidade da Educação. Esta Campanha foi uma iniciativa conjunta da Coalizão e da CLADE, envolvendo advogados da ONG DeJusticia e da Clínica de Direitos Humanos da Universidade de Cornell.
Guatemala – além das duas experiências reportadas acima, o relatório internacional de avaliação destaca os esforços do Coletivo Educação para Todos e Todas da Guatemala, que também resultaram no reconhecimento oficial da gratuidade da educação. Neste país, se movimentou uma campanha de conscientização sobre a necessidade de universalizar a gratuidade da educação e, assim, exigir o fim das taxas e cobranças nas escolas, anteriormente consideradas legais e autorizadas por um Acordo de Governo. O Coletivo atuou na defesa irrestrita da gratuidade do direito à educação, fazendo frente ao programa de Autogestão Educativa, liderado pelo Ministério da Educação. Com um viés neoliberal, este programa deixava para as escolas e comunidades a responsabilidade de financiar o processo educativo.
África e Ásia também desenvolveram atividades importantes no marco do PIP. Conheça, abaixo:
África
• Malawi – Influência da sociedade civil nos processos eleitorais e orçamentários
A Coalizão da Sociedade Civil para a Educação Básica de Qualidade valeu-se de seu potencial de participação junto a vários grupos – das comunidades ao Comitê Educativo Especial do Parlamento e os meios de comunicação – na defesa dos temas educativos, considerados altamente prioritários na política nacional.
• Tanzânia – Participação eficaz dos Centros de Organização Social (COS) nas reformas políticas
O compromisso político com o Ministério da Educação é uma peça-chave para a Rede Educativa da Tanzânia/Mtandao wa Elimu. A coalizão foi exitosa em seu diálogo com o governo nacional, conseguindo incidir sobre o projeto de Lei de Educação nacional, que está para ser promulgado.
• Quênia – Porque o financiamento da educação é um tema importante
A Coalizão Elimu Yetu (EYC) adotou como estratégia incidir nos processos eleitorais, para avaliar a capacidade de resposta dos partidos políticos em seus processos para angariar votos. Ao entrelaçar a procura por votos dos candidatos com dotações orçamentárias, a EYC abriu espaço para os COS exigirem o aumento dos recursos investidos em educação.
• Uganda – Em busca de transparência na implementação de políticas
O Fórum para a Educação das ONGs na Uganda trabalhou para encontrar espaço e interlocutores nos espaços de produção de políticas e práticas, fomentando a participação de dentro, inclusive no período que antecedeu a entrada em vigor da Lei Educativa de 2008.
Ásia
• Índia – Campanha para a Lei do Direito à Educação
Na Índia, a Coalizão Nacional para a Educação (CNE) fez campanha em favor de uma legislação que garanta a educação obrigatória e gratuita as crianças de 0 a 18 anos. O principal argumento dessa mobilização era que a educação obrigatória pode pôr fim ao trabalho infantil.
• Sri Lanka – Campanha pela educação das mães
No Sri Lanka, a Coalizão para o Desenvolvimento Educativo (CDE) desenvolveu uma campanha pela educação de pessoas adultas, mais concretamente para as mulheres que foram obrigadas a abandonar a escola ainda muito jovens, buscando fortalecer seus processos de empoderamento e prepará-las para apoiar a educação de suas filhas e filhos.
• Camboja – Campanha contra as tarifas escolares informais
No Camboja, a ONG Sociedade Educativa (NEP) persuadiu o governo a barrar a cobrança de tarifas escolares informais que restringiam o acesso das crianças à educação e pelo aumento dos salários dos e das professores/as.
• Filipinas – Mobilização de jovens não escolarizados para incidir pelo financiamento da educação
Nas Filipinas, a Rede da Sociedade Civil para a Reforma Educativa (E-net Filipinas) fez uma campanha em favor de maiores investimentos públicos nos Sistemas Alternativos de Formação, para proporcionar oportunidades educativas aos jovens que abandonavam os centros escolares, ou mesmo aos que não tinham acesso a eles e, portanto, que não estavam cobertos pelo sistema escolar formal.